segunda-feira, 25 de março de 2013

QUE NOSSA SEMANA SEJA LIDERADA E ABENÇOADA POR ÈSU E NOSSO ORI PARA QUE TENHAMS SORTE, AMOR, FELICIDADE E VITÓRIAS EM NOSSOS CAMINHOS. "Kò sí èyí tí yọ́ọ̀ mọ́ọ jẹun
Tàbí yọ́ọ̀ mọ́ọ se ìgúnwà tí
Kò ní fi ti Èṣù síwájú

Não existe ninguém que coma,
Ou esteja instalado com realeza,
Sem que haja recorrido a Èṣù primeiro."

Compartilho com vocês esta conversa !!!!!!!
O céu e a terra fundiam-se no horizonte distante, parecendo uma coisa só, como se não houvesse separação entre o mundo espiritual e o material, a consciência individual e a cósmica. 
Sentado sobre uma pedra em uma enorme montanha (vulcão), de cabeça baixa e olhos apenas entre abertos, Elegbára observava o fenômeno da natureza e refletia sobre o seu interminável trabalho. 
Como é difícil a humanidade – pensou em certo momento – parece nunca estar satisfeita, está sempre querendo mais e, em sua essência egoísta desarmoniza tudo, tudo... Tudo que era para ser tão simples acaba tão complicado.
Com os olhos habituados a enxergar na escuridão e na distância, Bára observou cada canto daqueles arredores. Viu pessoas destruindo a si mesmas através de vícios variados, viu maldades premeditadas e outras praticadas como se fossem atos da mais perfeita normalidade. Viu injustiças, principalmente contra os mais fracos e indefesos. Com seus ouvidos, também atentos a tudo, ouviu mentiras, palavras de maledicência, gritos de ódio e sussurros de traição.
Bára suspirou.
Serei eu o diabo da humanidade? – pensou ironicamente, ao lembrar o quanto era associado à figura do demônio. Passou horas observando coisas que estava habituado a ver todos os dias: mentiras, fraudes, corrupção, traições, inveja, e uma gama enorme de sentimentos negativos.
Foi quando estava imerso nesses pensamentos que Bára ouviu uma voz ao seu lado, dizendo naquele tom austero, porém complacente:
Laroyê, Senhor Falante.
Bára(Exu) ergueu os olhos e vislumbrou a figura altiva de Obatala.
Èpa Bàbá – respondeu, fazendo um pequeno movimento com a cabeça, em sinal de respeito.
Noto que está pensativo, amigo Bára – falou Obatala 
Bára respirou fundo, contemplou novamente o horizonte e respondeu:
Trabalhamos tanto... e incansavelmente, mas os homens parecem não valorizar nosso esforço.Obatalá moveu os lábios para dizer algo, mas antes que isso acontecesse, Bára, como que prevendo o que seria dito, continuou:
Não falo em tom de reclamação, sou um trabalhador incansável e o amigo sabe disso. É com prazer que levo o que tem ser levado e retiro o que deve ser retirado. É com satisfação que abro ou fecho os caminhos, de acordo com a necessidade de cada um, é com resignação que acolho sobre minhas costas largas a culpa do mal que muitos espíritos encarnados e desencarnados fazem, não reclamo do meu trabalho. Sou Bára, para mim não existe frio ou calor, cansaço ou preguiça, existe apenas a necessidade de cumprir a tarefa para qual fui designado.
Se mostra tão resignado e, no entanto, parece que deixa-se abater pelo desânimo – comentou Obatalá, apoiando-se em seu paxorô.
Bára soltou uma gargalhada, ao que Obatalá deu um leve sorriso, com um movimento quase imperceptível no canto direito dos lábios.Não sou resignado nem tampouco estou desanimado – falou Bára – estou pensativo sobre pouca inteligência dos homens. Veja só: como responsável pela aplicação da Lei Cármica observo muita coisa. Observo não apenas o sofrimento que alguns homens impõem a si mesmos, mas vejo também as incessantes oportunidades que o Universo dá a cada um dos seres que habitam a Terra. O aprendizado que tanto precisam lhes é dado por bem, mas quase nunca enxergam pelo amor, então lhes é dada a oportunidade de aprender pela dor, mas geralmente só lembram a lição enquanto a dor está a alfinetar sua carne. Com o alívio vem o esquecimento e todos os erros e vícios voltam a aflorar.
Obatalá fez menção de dizer algo, mas com o dedo em riste entre os lábios, novamente Bára o impediu de falar.
Ouça Obatalá – disse Bára, colocando a mão em concha na orelha, como se ele e Obatalá precisassem disso para ouvir melhor. E ambos ouviram o som que vinha da Terra. O som da inveja, dos maus sentimentos, da maledicência, da promiscuidade, da ganância. Bára deu outra gargalhada e disse:
Percebe? Temos trabalho por muitos séculos ainda.
E isso não é bom? – perguntou Obatalá, que dessa vez não deixou Bára responder e continuou:
Pobres homens, ignorantes da própria grandeza espiritual e da simplicidade do Universo. Se não desconhecessem tanto o funcionamento das coisas, seriam mais felizes.
Não estão preocupados em discernir o bem do mal – resmungou Bára.
E você está, Senhor Falante? – tornou Obatalá. 
Mais uma vez Bára gargalhou.
Para mim não existe o bem ou o mal. Existe o justo, bem sabe disso.
Então por que tenta exigir esse discernimento dos pobres homens?
Eu conheço os caminhos – respondeu Bára um tanto irritado – para mim não existem obstáculos, todos os caminhos se abrem em encruzilhadas. Para mim as portas nunca se fecham e as correntes nunca prendem. Conheço o sutil mistério que separa aquilo que chamam de bem daquilo que chamam de mal. Não sou maniqueísta, não sou benevolente, pois não dou a quem não merece, mas também não sou cruel, pois sempre ajo dentro da Lei. Os homens, coitados, acreditam na visão simplista do bem e do mal, como se todo o Universo, em sua “complexa simplicidade” se resumisse apenas entre o bem e o mal. Pobres homens – repetiu Obatalá.
Pobres homens – concordou Elegbára – mesmo olhando o Universo de uma forma tão simplista, dividido apenas entre bem e mal, acabam sempre demonizando tudo, achando que o mal é o melhor caminho para conseguir o que desejam ou então acreditam que são eternas vítimas do mal. E o que é pior, quase sempre eu é que sou o culpado.
Mas é você o responsável pelo mal? – perguntou Obatala´, admirando o horizonte. Sou justo, apenas isso – respondeu Bára.
Não seria a justiça uma prerrogativa de Xangô? – tornou o maior dos orixás.
Bára olhou fundo nos olhos de Obatalá e respondeu:
Estou a serviço do Universo, de cada uma das forças que o compõe, inclusive do Senhor da Justiça Isso significa que trabalha em harmonia com o Universo, caro Bára?
Imaginei que soubesse disso – respondeu , irônico como sempre.
Acho que sempre soube. Quando observo o horizonte e vejo o céu fundindo-se à Terra, percebo o quanto o material pode estar ligado ao espiritual. Mas também lembro que o sol vai raiar e acredito que apesar de todas as dificuldades que os próprios homens criam, é possível acender a chama da fé em seus corações. Percebo o quanto eles são falhos, mas percebo também o quanto são frágeis e precisam de nós – e nesse momento pousou a mão sobre o ombro de Elegbára – sejam dos que trabalham na luz ou na escuridão, pois tudo faz parte do Uno e se inter-relacionam. O mesmo homem que hoje está nas profundezas mais abissais, amanhã pode ser o mensageiro da luz.
Bára olhou para os olhos de Obatalá, como se não estivesse concordando, mas dessa vez foi Obatalá quem não deixou que o outro falasse, prosseguindo com sua narrativa: Se não fossem os valorosos guardiões que trabalham nas regiões trevosas, (chamam na terra erradamente de exus, o povo de rua como alguns conhecem) dificilmente os que ali sofrem um dia alcançariam o benefício da luz. Se houvesse apenas a luz, não haveria o aprendizado, que tem como ponto de partida o desconhecimento, as trevas. O Universo tão simples é ao mesmo tempo tão inteligente, que mesmo nós, que observamos os homens a uma distância grande, às vezes nos surpreendemos com sua magnitude. Os homens são frutos que precisam amadurecer e você, amigo Bára, é a estufa que os aquece até o ponto certo da maturação e eu sou a mão que os colhe como frutos amadurecidos.
Quem diria que trabalhamos em harmonia? – disse Bára em meio a um sorriso – acreditam que vivemos a digladiar quando na verdade trabalhamos em busca de um mesmo objetivo: o aprimoramento da raça humana.
Obatalá só não soltou uma gargalhada porque não era esse seu hábito (e sim o de Exu), mas disse sem conseguir esconder o contentamento:
Então, companheiro Bára, não temos porque lamentar. A ignorância em que vivem os homens é sinal de que ainda temos trabalho a realizar. A pouca sabedoria que possuem significa que ainda estão muito próximos ao ponto de partida e cabe a nós, não importa se chamados de “direita” ou “esquerda”, auxiliá-los em sua caminhada, que é muito longa ainda. Apenas contemplar as mazelas dos corações humanos não irá auxiliá-los em nada. Sou a luz que guia os olhos da humanidade e você é o movimento que não a deixa estática. Se pararmos por um segundo sequer, atrasaremos em séculos e séculos o progresso da raça humana, que tanto depende de nós.
Nesse momento o sol começou a raiar timidamente no horizonte, separando o céu e a Terra. Elegbára levantou-se da sua pedra e se pôs a caminhar montanha abaixo. Onde vai, Senhor Falante? – perguntou Obatalá, como se não soubesse.
Vou trabalhar, Senhor da paz – respondeu gargalhando novamente – Esqueceu que sou um trabalhador incansável e que trabalho em harmonia com o Universo, mesmo que ele me imponha a luz do sol?
Obatalá não respondeu, mas esboçou um sorriso tímido. Assim trabalhava o Universo: sempre em harmonia. Os homens, mesmo ainda presos a tantos conceitos primários, trilhavam os primeiros passos em direção ao progresso, pois não estavam órfãos de seus orixás e protetores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário